Gueroba [Syagrus oleracea (Mart.) Becc.]

by 8/25/2019 10:05:00 AM 0 comentários

Quando falamos em culinária regional, alguns sabores são emblemáticos. Para mim, quando se fala em comida goiana, vem logo à memória o empadão goiano, que nada mais é do que uma empada gigante recheada com frango, queijo, linguiça e gueroba ao gosto do cozinheiro. A gueroba ou guariroba, como também é chamada em Goiás, é uma palmeira que produz um palmito amargo bastante apreciado na cozinha regional. Assim como o pequi, o sabor é forte, e não existe meio termo, ou você ama ou odeia. 

O sabor se assemelha ao do jiló e o amargor pode ser controlado durante o cozimento, ou efetuando-se um escaldamento do palmito até suavizar o sabor. Aliás, por falar em amargor, a comida goiana tem, além da gueroba e do jiló, outro ingrediente de peso, um pouco menos conhecido e já tratado aqui neste blog, que é a jurubeba (Link). Esse trio é inesquecível! 

Empadão goiano: prato tradicional indispensável a quem vai conhecer as cidades históricas de Goiás
Descrição botânica: Da família Arecaceae, a gueroba é caracterizada pelo seu caule solitário e fino, que pode alcançar entre 5 a 20 metros de altura. As folhas têm coloração verde-escura, até 3 m de comprimento (compostas 100 a 200 pinas cada), concentradas em espiral no final do tronco, dispostas entre 15 a 20 unidades, formando copa arredondada. As inflorescências são interfoliares e recobertas por uma proteção lenhosa (raque); as flores são pequenas, de coloração creme e numerosas. Os frutos (coquinhos) têm formato arredondado (elipsoide) e coloração verde-amarelada. 

Inflorescência de guerobeira visitada por abelhas arapuás (polinizadores)
Onde ocorre: A gueroba é uma palmeira nativa, só encontrada no Brasil (endêmica), especialmente no Cerrado do planalto central, desde o norte do Paraná, até o Mato Grosso, Tocantins e sul-sudeste da Bahia. 

Cacho com frutos ainda verdes
Usos: Planta de uso alimentício, ornamental, medicinal, forrageira (frutos) e oleaginosa. O palmito é a porção comestível e pode ser empregado na culinária em diversas preparações. Além do recheio do famoso empadão goiano, pode ser usado em saladas, molhos e complementos. Quanto aos aspectos nutricionais, o palmito é rico em vitamina C, potássio, fósforo, antioxidantes e fibras, além de apresentar baixo índice calórico, são menos de 12 calorias em cada 100g de produto in natura. A amêndoa dos frutos também pode ser usada como alimento. No interior de Goiás ela é o ingrediente principal do “doce de taia”. É rica em óleo, sendo considerada um alimento de elevado valor calórico, com mais de 600 kcal em cada 100g de amêndoa in natura. O óleo pode ser empregado na produção de cosméticos. 

No livro Biodiversidade Sabores e Aromas (link no final do texto), o leitor poderá encontrar dicas e muitas receitas com o palmito, a exemplo do patê, a pamonha de frango com gueroba, o arroz de puta rica e a chica-doida, receitas tradicionais, simples e muito saborosas da cozinha goiana. 

A planta apresenta excelentes qualidades para uso no paisagismo, com destaque para o belo aspecto plástico conferido pelo seu caule único e afilado, terminando em copa arredondada, além da ausência de espinhos, facilidade de cultivo e resistência à seca, pragas e doenças. A planta é presença obrigatória nos diversos jardins de Burle Marx em Brasília, além de muitas outras cidades da região Centro-Oeste. 

Uso da gueroba no paisagismo. Praças dos Cristais- Brasília-DF.
Aspectos agronômicos: A produção de mudas é feita por sementes, que devem ser semeadas em sacos plásticos individuais. O percentual de germinação é de aproximadamente 60% e demora em torno de 100 a 120 dias para germinar. Dê preferência sempre à coquinhos maiores, que produzem mudas mais robustas. O substrato para germinação deve conter 3 partes de solo para uma parte de esterco bovino e, para cada 100kg de substrato, 2,5 kg de NPK 4-14-8 ou outra formulação organo-mineral similar, o que proporciona melhor formação das mudas quando se deseja iniciar um cultivo comercial. Quando as mudas atingiram cerca de 30 a 40 cm de altura podem ser plantadas nos locais definitivos e a colheita do palmito se dá após 3 ou 4 anos. O plantio das mudas deve ser feito em solo leve, bem drenado e rico em matéria orgânica. As plantas preferem locais de clima quente e, embora tolerem bem a seca, a irrigação constante resulta em crescimento mais rápido e plantas mais bonitas. 

Para o cultivo em jardim valem as mesmas regras, contudo, as mudas podem ser facilmente adquiridas em viveiros da sua região. O cultivo deve ser feito em espaços amplos e longe de redes elétricas e residências, uma vez que a planta pode crescer bastante. 

Observação importante: O cultivo comercial dessa espécie, ainda que em pequena escala, é de extrema importância para preservar as guerobeiras no ambiente natural, uma vez que a extração do palmito implica obrigatoriamente na morte da planta e esta não rebrota. Então, nunca colha o palmito direto da natureza, nem compre produtos sem saber a procedência, você poderá estar contribuindo, sem saber, para a destruição da nossa biodiversidade. Conhecer a procedência do alimento que estamos comprando é uma obrigação enquanto consumidores, além de valorizar e apoiar quem produz de forma correta. 

Palmito de gueroba in natura comercializado em feiras livres de Goiás. Foto: J.P. Bucher

Bibliografia recomendada 

Santiago, R.A.A.; Coradin, L. Biodiversidade Brasileira: sabores e aromas. Ministério do Meio Ambiente. 2018. Link

Soares, K.P. Syagrus in Flora do Brasil 2020 em construção. Jardim Botânico do Rio de Janeiro.  <Link>

Vieira, R.F.; Camillo, J.; Coradin, L. Espécies nativas da flora brasileira de valor econômico atual ou potencial : plantas para o futuro: região Centro-Oeste. MMA, 2018. Link

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