Sempre-vivas do Cerrado

by 11/08/2020 04:19:00 PM 1 comentários

As sempre-vivas ou flores secas são um patrimônio do Cerrado. Enquanto plantas vivas apresentam importante papel ecológico na conservação da vida nas veredas e campos rupestres. Na forma de plantas secas, embelezam e trazem vida aos espaços, em arranjos diferenciados, delicados e de longa durabilidade. Como não existe apenas uma espécie de sempre-viva, mas um universo de tipos e possibilidades, vou falar de forma genérica e mostrar um pouco da minha admiração por elas. 


É importante ressaltar que todo o comércio de sempre-vivas no Cerrado, e em outros biomas, é abastecido unicamente pelo extrativismo, ou seja, não existem cultivos comerciais destas espécies. Via de regra, as flores secas e outras partes vegetais usadas no artesanato, são colhidos diretamente em populações naturais e sua coleta indiscriminada, especialmente de flores, impede a formação de sementes e a perpetuação das populações naturais, o que pode levar uma espécie ao risco de extinção em curto prazo. Aliás, boa parte das sempre-vivas nativas que encontramos nas feiras e mercados regionais estão ameaçadas de extinção, algumas consideradas criticamente ameaçadas. Por isso é muito importante, sempre que possível, conhecer um pouco sobre o produto e como ele é produzido para, assim, efetuar uma compra mais consciente. 


Descrição botânica: As plantas das famílias Eriocaulaceae e Xyridaceae compreendem alguns dos gêneros mais conhecidos de sempre-vivas exploradas no Brasil. Possivelmente, os gêneros mais expressivos dentro deste universo no Cerrado seja Eriocaulon, Paepalanthus, Syngonanthus e Xyris. De modo bem genérico, estes gêneros são compostos por espécies de plantas herbáceas, perenes ou anuais (menor quantidade), caracterizadas pelo endemismo, ou seja, as plantas ocorrem em locais e climas bastante específicos, o que dificulta também o cultivo em escala comercial. 

Sabe-se que existem outras várias famílias botânicas de sempre-viva de importância como flor seca, incluindo-se aqui os capins, mas vamos resumir o assunto, porque isso daria várias teses de discussão botânica. Aliás, aqui vai uma sugestão para o pessoal da pesquisa: existe pouquíssima informação sobre o uso, principais espécies, cultivo e cadeia produtiva de flores secas no Brasil. Que tal? 


Onde ocorrem: As sempre-vivas não são exclusivas do Brasil nem do Cerrado, é possível encontrar essas plantas na Caatinga, no Pantanal, no Pampa e até nas áreas de savana da Amazônia, no Brasil e em países vizinhos. Existe uma espécie de sempre-viva que se acreditava ser endêmica do Monte Roraima e por isso foi denominada Xyris roraimae. Posteriormente, em 1996, descobriu-se que a espécie ocorre também nas áreas de Cerrado do Brasil central e, junto com Xyris paradisiaca, formam uma dupla das mais representativas do gênero e facilmente encontradas no comércio regional. 


Usos: As sempre-vivas são usadas como flor seca, ao natural ou em combinação com outras partes vegetais, compondo arranjos diferenciados. Quando se fala em “flor seca” ou flor desidratada, é importante lembrar que na composição do arranjo podem também ser usadas diversas partes vegetais, incluindo pequenos ramos, folhas secas e frutos. Algumas espécies são colhidas já desidratadas e outras precisam passar por um processo de desidratação antes de serem comercializadas. Muitas espécies são colhidas durante a época de seca no Cerrado, o que evita custos com a secagem, além de facilitar o trabalho dos artesãos. 


Embora não se tenha um estudomais completo para apoiar esta afirmação, minha experiência de campo me faz crer que o volume de flores secas (sempre-vivas) comercializado regionalmente é bastante significativo, em especial nos estados de Minas Gerais, Bahia, Goiás e Tocantins. Alguns pesquisadores relatam um declínio considerável no volume comercializado nas últimas décadas, porém, também não mencionam valores, de forma a dar uma ideia mais clara da situação. Entretanto, sabe-se que o Brasil é um dos fornecedores de flores desidratadas para o mercado europeu, o que não é pouca coisa. 


Aspectos agronômicos: Praticamente nada se sabe sobre o cultivo de sempre-vivas para fins de decoração ou no paisagismo. Sabe-se que para boa parte das espécies a propagação é feita por sementes e, em alguns casos, por divisão de touceiras. O cultivo deve ser em pleno sol e a maioria prefere clima quente e seco. No estado de Minas Gerais existem algumas iniciativas de cultivo de sempre-vivas, mas ainda não é possível encontrar mudas a venda no comércio. Vale lembrar que a retirada de plantas da natureza, sem as devidas autorizações legais, é crime ambiental, além de causar prejuízos às populações nativas, pode render multa e até prisão. Vamos apreciar sem destruir. 

Curiosidades: Quem visita Brasília não pode deixar de conhecer a feirinha de flores secas da Catedral, junto à esplanada dos ministérios. São inúmeras espécies de sempre-vivas nativas e exóticas sendo comercializadas, e o colorido é de encher os olhos. É um lugar encantador e uma boa lembrança da nossa linda capital da República. As fotos que ilustram esta publicação e alguns dos meus livros, foram feitas nessa feirinha, é um dos meus lugares preferidos no coração do Brasil. Vale a visita, recomendo! 


Bibliografia recomendada 

Wanderley, M.G.L. et al. Xyris paradisiaca e X. roraimae. In: Vieira, R.F.; Camillo, J.; Coradin, L. Espécies nativas da flora brasileira de valor econômico atual ou potencial: plantas para o futuro - Região Centro-Oeste. 2018. https://www.mma.gov.br/publicacoes/biodiversidade/category/54-agrobiodiversidade

Um comentário:

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